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domingo, 30 de dezembro de 2018

As Histórias...

As histórias...
As lembranças nem sempre têm a ver com fatos; os fatos podem ser contestados; as lembranças, jamais porque são as histórias...
Há histórias que surgem de lugares misteriosos, longínquos, desconhecidos; há outras que são descobertas em meio a destroços ou enterradas sob vários anos; há as que são criadas e outras que são vividas...
Assim, são as histórias... enterre as páginas escritas ou as permita tomarem vida pelas mãos do escritor e os olhos de um leitor... E, de repente...
As palavras tomam vida no papel e a história escreve-se a si mesma... O autor é apenas um escriba que transcreve com habilidade as emoções e acontecimentos...
Não é possível relembrar fatos com exatidão...
Quase dezessete anos se passaram; a posição das nuvens no céu, o ritmo do vento batendo na pele, a sonoridade da respiração, a conjunção dos astros... O que é possível dizer é aquilo que as lembranças permitirem.
O destino que mais importa na vida de qualquer pessoa é o relativo ao amor. Uma história de amor tem um valor e significados maiores: o poder de lembrar que há momentos em que o destino é o amor se chocam... A maioria das pessoas traz consigo a eterna pergunta: “ e se eu tivesse feito o que meu coração mandou? “...
Não há como saber a resposta, uma vez que uma vida não passa de uma série de pequenas vidas, vividas um dia por vez. Cada um desses dias, sem percebermos ou sem querermos, envolve escolhas e consequências... Parte por parte, pedacinho por pedacinho, essas escolhas ou decisões ajudam a formar e a transformar a pessoa que nos tornamos.
A história se escreve por si, mas quem pode dizer que a junção dos fragmentos das lembranças apresentadas, montou o quadro como retrato verdadeiro e fiel de como esse casal realmente se encontrou... Talvez a fé na estranha força do amor possa renovar a história e se encarregue de terminar de escrevê-la... entre o Sol e a Lua...

terça-feira, 11 de julho de 2017

Preparar uma viagem...

Amor e tragédia na Família Maia...

Acordo, certo dia, e o primeiro livro que me ressalta aos olhos, abandonado na estante por anos, Os Maias... De repente, me vejo envolvida, novamente, após muitos anos, por Eça de Queiroz, com seus fascinantes personagens e sua trágica história de amor que envolve três gerações. Escuto música ao vento e me reporto a Lisboa do século XIX...Encontro-me com Afonso da Maia, Pedro da Maia e Maria Monforte, Carlos Eduardo e Maria Eduarda, além do estimado João da Ega,  assim, sem querer, me envolvo em mistérios, luxúria, alegrias, dissabores e lágrimas...
Os Maias é uma das obras mais conhecidas do escritor português Eça de Queiroz. O livro foi publicado no Porto em 1888. A obra ocupa-se da história de uma família (Maia) ao longo de três gerações. Tudo começa com a descrição da casa – “O ramalhete”- Lisboa, mas que nada tem de fresco ou de campestre. O nome vem-lhe de um painel de azulejos com um ramo de girassóis, colocado onde deveria estar a pedra de armas.
Afonso da Maia, senhor da casa, casou-se com Maria Eduarda Runa e deste casamento resultou apenas um filho - Pedro da Maia, que teve uma educação tipicamente romântica, era muito ligado à mãe e após a sua morte ficou inconsolável, tendo se recuperado quando conheceu uma mulher chamada Maria Monforte, com quem casou, apesar de Afonso não concordar. Deste casamento, resultaram dois filhos: Carlos Eduardo e Maria Eduarda. Algum tempo depois, Maria Monforte apaixona-se por Tancredo (um príncipe napolitano, italiano que Pedro fere acidentalmente num acidente de caça e acolhe em sua casa) e foge com ele para Itália, levando consigo a filha, Maria Eduarda. Quando sabe disto, Pedro, destroçado, vai com Carlos para casa de Afonso, onde comete suicídio. Carlos fica na casa do avô, onde é educado à moda inglesa (tal como Afonso gostaria que Pedro tivesse sido criado).

Passam-se alguns anos e Carlos torna-se médico - abre um consultório. Mais tarde, conhece uma mulher no Hotel Central num jantar organizado por Ega (seu amigo dos tempos de Coimbra) em homenagem a Cohen. Essa mulher, vem mais tarde saber, chamar-se Maria Eduarda. Os dois apaixonam-se. Carlos crê que a sua irmã morreu. Maria Eduarda crê que apenas teve uma irmãzinha que morreu em Londres. Os dois namoram em segredo. Carlos acaba depois por descobrir que Maria lhe mentiu sobre o seu passado – podiam ter-se zangado definitivamente. Guimarães vai falar com João da Ega, e dá-lhe uma caixa que diz ser para Carlos ou para a sua irmã Maria Eduarda. Ega descobre tudo, conta a Vilaça (procurador da família Maia) e este acaba por contar a Carlos o incesto que anda a cometer. Afonso da Maia morre de desgosto. Carlos e Maria separam-se. Carlos vai dar uma volta ao mundo. O romance termina quando Carlos, passados 10 anos, regressa a Lisboa de visita. O final é ambíguo, como o foi a ação de Carlos e João da Ega ao longo da narrativa: embora ambos afirmem que "não vale a pena correr para nada" e que tudo na vida é ilusão e sofrimento, acabam por correr desesperadamente para apanhar um transporte público que os leve a um jantar para o qual estão atrasados.

http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.do?select_action=&co_obra=2683

O autor: José Maria de Eça de Queiroz (Póvoa de Varzim, 25 de novembro de 1845 — Paris, 16 de agosto de 1900) foi um dos mais importantes escritores portugueses da história. Foi autor de romances de reconhecida importância, de Os Maias e O Crime do Padre Amaro; o primeiro é considerado por muitos o melhor romance realista português do século XIX.

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

SOMOS FILHOS DE MIL HOMENS E DE MIL MULHERES...

Onde estão os Crisóstomos nesse mundo?



“Um homem chegou aos quarenta anos e assumiu a tristeza de não ter um filho. Chamava-se Crisóstomo.”

Começa assim a obra de Valter Hugo Mãe,com várias histórias paralelas, inicialmente independentes, mas que aos poucos se entrelaçam.  Um pescador de quarenta anos, Crisóstomo, que carrega no peito da dor de não ser pai. Desesperado e decidido a encontrar um filho para lhe acompanhar ao longo da sua trajetória, ele adota Camilo, um rapaz de 14 anos, filho de uma anã e de prováveis 15 homens. 

A sensação de vazio diminui e ele passa a viver melhor, porém, um tempo depois ele sente vontade de conhecer um novo sentimento: o amor. É nesse momento que novos personagens começam a aparecer na trama, entre eles, Isaura, uma mulher que cedeu aos prazeres da carne muito nova e passou a vida suportando o peso da sua escolha. 

Antonio, conhecido em toda aldeia como "homem maricas" e Matilde, a mulher que carrega a culpa pelos erros cometidos com o filho que ela tem medo de aceitar, para estar de acordo com os preceitos sociais.

Apesar de terem vivências diferentes e vidas completamente opostas, todos estão unidos pela mesma sensação: a incompletude. Essa sensação, que causa angústia, dor e solidão, acaba sendo a responsável por uma aproximação entre eles, o que revela novas possibilidades, novas chances de viver e de encontrar, mesmo que discretamente, a   “felicidade”.

“O Crisóstomo explicava que o amor era uma atitude. Uma predisposição natural para se ser a favor de outrem. É isso o amor. Uma predisposição natural para se favorecer alguém. Ser, sem sequer se pensar, por outra pessoa."

Com uma narrativa poética, reflexiva e emocionante, esse é um livro sobre os seres humanos, as suas imperfeições, medos, dores e anseios. Um livro que discorre com muita sinceridade sobre a capacidade de amar, de perdoar, de sonhar, de ser e de renascer.

O interessante é que o autor nos coloca diante de personagens incompletos, que mesmo marcados por dores incuráveis, não conseguem deixar de lado os preconceitos sociais. Com posicionamentos e presos a   valores morais retrógrados, todos eles precisam (re)descobrir uma nova forma de “crescer”.

"A solidão podia transformar os homens em seres quase de fantasia por lhes mexer na cabeça e obrigar o coração a legitimar como verdadeira a mais pura ilusão."

Mergulhar nessa história demanda coragem e sensibilidade, ousadia e paixão...Demanda descobrir que somos filhos de mil homens e mil mulheres...





Obra: O Filho de Mil Homens 
Autor: Valter Hugo Mãe
Editora: Biblioteca Azul
Preço: R$ 35,90

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

"Enquanto escrever e falar vou ter que fingir que alguém está segurando a minha mão". Clarice Lispector.

A POSSÍVEIS LEITORES


"Este livro é como um livro qualquer. Mas eu ficaria contente se fosse lido apenas por pessoas de alma já formada. Aquelas que sabem que a aproximação, do que quer que seja, se faz gradualmente e penosamente - atravessando inclusive o oposto daquilo que se vai aproximar. Aquelas pessoas que, só elas, entenderão bem devagar que este livro nada tira de ninguém. A mim, por exemplo, o personagem G. H. foi dando pouco a pouco uma alegria difícil; mas chama-se alegria. "
C.L. *


Assim, inicia-se: A Paixão Segundo G.H., de Clarice Lispector (1920 - 1977), que traz em seu enredo uma mulher, identificada, com todos os seres, apenas pelas iniciais G.H., que após demitir a empregada, entra em seu quarto para limpá-lo, matando uma barata esmagada na porta do guarda-roupa. Relata, assim, a perda de sua individualidade.
No dia seguinte, narra a própria impotência em descrever o episódio. 
A história se organiza em capítulos de sequência sistemática – todos os capítulos começam com a frase que encerra o anterior. A interrupção, assim, é elemento de continuidade, numa representação simbólica do que é a experiência de G.H. 
O ápice da revelação acontece na cena mais famosa do romance. A barata, após perder sua casca, expele a secreção branca que aparece como sua última essência. Estaria aí a renúncia que a personagem faz a seu próprio ser como linguagem, que, logo após o ato, entrega-se ao silêncio.



A Paixão Segundo G.H.

Autora: Clarice Lispector
Editora: Rocco
Preço: R$ 18,60
Livraria Saraiva
Acessado em 13/10/2016

sábado, 8 de outubro de 2016

Literatura e o tempo da arte.


Se alguém me pedir para explicar o significado de Literatura, ficarei propensa em dizer que a entendo como a arte de compor a vida em prosa ou verso.

Em termos conceituais, a palavra Literatura vem do latim "litteris" que significa "Letras", e possivelmente uma tradução do grego "grammatikee". Em latim, literatura significa uma instrução ou um conjunto de saberes ou habilidades de escrever e ler bem, e se relaciona com as artes da gramática, da retórica e da poética. Refere-se à arte ou ofício de escrever de forma artística. O uso estético da linguagem escrita.

Eis que me deparo com uma explicação poética sobre Literatura, num jovem  promissor poeta e escritor de São Paulo, Edivaldo Ferreira dos Santos, em seu, como ele gosta de chamar, “livreco” Ragtimes, beijos na nuca &  buracos no peito...


"O tempo da arte é outro 

Fazer arte não leva tempo


Leva vidas" 

Edivaldo Ferreira

Ragtimes, beijos na nuca & buracos no peito
Autor: Edivaldo Ferreira 
Capa: Ramon Rodrigues

Bar editora
Coleção Literatura de Buteco, 2016
Pocket book
Preço: R$ 12,00.


sexta-feira, 7 de outubro de 2016

Quem pensa em A máquina de fazer espanhóis, pensa nas passagens da vida...

Um dia desses, encontrei numa página de rede social uma indicação literária de uma amiga muito querida, que ao pensar em minha "alma lusitana" resolveu marcar meu nome e assim, surgiu meu desejo por Walter Hugo Mãe e sua A máquina de fazer espanhóis. Confesso que pensei, como um escritor português escreve sobre "fazer espanhóis"? Eis que vou ao meu passeio mensal na Livraria Cultura do Conjunto Nacional em São Paulo e encontro a obra. Apaixonei-me pelo Senhor Silva. Começamos nossa história assim, no primeiro capítulo...

somos bons homens. não digo que sejamos assim uns tolos, sem a robustez necessária, uma certa resistência para as dificuldades, nada disso, somos genuinamente bons homens e ainda conservamos uma ingênua vontade de como tal sermos vistos, honestos e trabalhadores. um povo assim, está a perceber. pousou a caneta. queria tornar inequívoca aquela ideia e precisava de se assegurar da minha atenção. não tenho muita vontade de falar, sabe, senhor, estou um pouco nervoso, respondi. não se preocupe, continuou, a conversa e mais para o distrair e, se ficar distraído sem reacção, também não lho levo a mal. e o que fez a liberdade, acrescentou. um dia estamos desconfiados de tudo, e no outro somos os mais pacíficos pais de família, tão felizes e iludidos. e podemos pensar qualquer atrocidade saindo à rua como se nada fosse, porque nada é. as ideias, meu amigo, são menores nos nossos dias. não importam. as liberdades também fazem isso, uma não importância do que se pensa, porque parece que já nem é preciso pensar. sabe, é como não termos sequer de pensar na liberdade. é um dado adquirido, como existir oxigénio e usarmos os pulmões. não nos hão de convencer que volte a censura, qualquer tipo de censura, isso seria uma desumanidade e agora somos europeus.



A Máquina de Fazer Espanhóis, do escritor português Valter Hugo Mãe, para mim, foi um  mergulho no universo de um português, que aos 80 anos, após viver 46 anos ao lado de sua amada que se despede da vida,  tenta reencontrar o sentido da vida em um lar, o Feliz Idade. No primeiro momento, fecha-se em sua casmurrice e se cala,  a fim de mostrar ao mundo a sua dor.

A vida, porém, continua, e por meio dos pequenos gestos de seu cuidador e da atenção dispensada pelos outros moradores do lar, aos poucos, nosso protagonista percebe  que todos carregam suas dores, mas que a vida não para e nos surpreende a todo instante. Proporcionando um  eterno aprendizado. Assim, começa a estabelecer laços de amizades com o Senhor Pereira, o Silva da Europa e o Esteves Sem Metafísica, do poema Tabacaria de Fernando Pessoa. 

Descobrir um autor como Valter Hugo Mãe é deparar-se com escritos singulares. O texto, todo escrito em letra minúscula, acompanha a narração do personagem principal, em primeira pessoa. Curiosamente, dois capítulos do livro, o quinto e o décimo sétimo, são grafados em caixa normal, aparecendo letras maiúsculas no início de parágrafos.
Mais do que relatar a história de um senhor português, Valter Hugo Mãe capta a identidade de um povo, seus costumes, sua história e o amor pelo seu país. Não se trata de um Senhor português, mas de muitos e tantos outros portugueses, que em comum compartilham uma alma lírica, às vezes alegre, na maioria das vezes melancólica. Não é um povo constituído meramente por pessoas nascidas em um mesmo país, mas por pessoas como que sagradas em versos formando uma grande poesia.
Máquina de fazer espanhóis
Autor:  Valter hugo mãe
Editora:  Biblioteca Azul
Páginas:  256 páginas
Preço: R$ 44,90
http://www.livrariacultura.com.br/p/a-maquina-de-fazer-espanhois-46335799

terça-feira, 4 de outubro de 2016

"Esperança nas Exceções"

Tudo o que me sobra é a esperança nas exceções, Edivaldo Ferreira.

Conheci o autor e poeta Edivaldo Ferreira num lugar inusitado, em seu trabalho, que é uma arte, a arte de sommelier de cerveja. Indicações perfeitas de acordo com a perspicácia e sabedoria que lhe são devidas. As indicações não param por aí... Admirador de jazz e rock, teatro, cinema, literatura, descobri que também é um escritor, tradutor e lançou um livro de poesias que me deixou surpresa pelo potencial do conteúdo à métrica, estrutura poética. 
As surpresas não param por aí...Um belo dia, ensolarado, eis que vejo um post com textos dele, Edi, para os amigos...Me emocionei, lágrimas que me encheram os olhos...

Compartilho o projeto do blog https://caosdescrito.wordpress.com/2015/09/02/pb/


Desenhar flores coloridas nas paredes da cidade cinza era um ato de rebeldia que ela praticava regularmente nas tardes em que cabulávamos aulas de Literatura, eu perguntava se não seria mais revolucionário plantar flores de verdade pela cidade e ela sorria e dizia que não dava tempo de esperar, que tinha pressa, com as tintas spray era fácil deixar o mundo mais bonito, mais colorido. “Que diferença faz um mundo bonito desenhado com linhas tortas numa parede descascada?”, eu me perguntava. A gente cresceu e envelheceu e eu me esqueci do seu rosto e agora minha filha teima em correr naquela rua de paralelepípedos contando as flores desenhadas na parede, que apesar do tempo, continuam ali. Eu também continuo por aqui, morando na mesma rua. Casei com uma mulher que não amo e tenho um trabalho que não gosto. Eu me deixei levar pelas regras desse jogo que a gente é obrigado a jogar no instante em que nasce e aqui estou eu, um funcionário medíocre com uma vida medíocre que todas as noites se esforça, sem sucesso, para lembrar orações que aprendeu quando criança. Outro dia numa livraria vi o nome dela, da garota que pixava flores coloridas, na capa de um livro de fotografias. Mas estavam todas em preto & branco. Vi escrito lá que ela viajou pelo mundo visitando florestas e tribos que têm pouco ou nenhum contato com o homem civilizado, sorte a deles. No fim do dia quando me debruço sobre textos inacabados que acabam no fundo da gaveta, cartas que eu nunca vou enviar ao lado de contas vencidas, enquanto escuto minha filha brincando na sala e penso sobre o tipo de ser humano que ela vai se tornar, tudo o que me sobra é a esperança nas exceções, uma planta nascendo no asfalto de uma cidade morta.
Foto: Matheus Cappellato / Texto: Edivaldo Ferreira

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